O cotidiano, o inesperado, a situação do caos nosso de cada dia está impresso nas telas dos gêmeos Letícia e Cirilo. Momentos instigantes que tiram o espectador do lugar comum e o leva a apreciar detalhes da pintura que releva um naturismo e ao mesmo tempo proporciona viagens nas formas e nas cores.  Vindos do interior de São Paulo, os dois criaram o duo Tangerina Bruno. Nomes díspares que revelam uma intrínseca sintonia.  Aqui eu corto e você rala. Ou ainda aqui eu crio o céu e você faz chover.

 Uma montagem pictórica que nos leva para o interior da vida de ambos. Um aprendizado para o espectador. Tangerina Bruno é representado pela galeria Kogan Amaro, em São Paulo e em Zurich.

Quando que vocês se conheceram?  E o trabalho em dupla como surgiu?

 Como irmãos gêmeos, sempre tivemos uma ligação muito forte e muito complementar. O interesse pela criatividade, imaginação e artes manuais é compartilhado desde sempre. Disso até a primeira obra como Tangerina Bruno, em 2013, foi um longo mas natural processo. Durante toda a adolescência, foi uma busca insana pra entender qual seria essa configuração enquanto dupla criativa. Tudo fez sentido quando fomos pra pintura e assumimos nosso sobrenome, Tangerina Bruno, como nosso nome artístico.

Tangerina Bruno – Estados Cotidianos

Como é o processo criativo?

 Nosso processo é construído na nossa convivência diária. É um diálogo constante e uma negociação entre Letícia e Cirillo enquanto irmãos, enquanto um duo artístico, enquanto pessoas individuais e enquanto Tangerina Bruno – dizemos que TB é uma terceira individualidade. E é muito orgânico, não existe uma linha delimitadora entre isso tudo, acontece junto – seja na hora da criação ou na feitura da obra. 

 

Tangerina Bruno: Lembra

 

Agora que vocês estão pesquisando?

Estamos sempre pintando. Nesse ano, começamos a explorar o que estamos chamando informalmente de “zooms no cotidiano”. Nessas obras, a escala das figuras aumenta, o que nos permite explorar outros aspectos da composição e interesses pictóricos. Na obra “Lembra?”, uma pintura de 154×159 cm, o ponto de partida foi representar uma picada de pernilongo na perna. Nossa pintura tem um interesse forte pelo desenho, as figuras são contornadas em tinta preta… essa coisa da linha está nos levando a experimentar com animação.

Tangerina Bruno – A Memória do Corpo,

 O interior de São Paulo tem muitas referências ela aparecem no seu trabalho?

Certamente existe uma influência estética e um apreço pelo decorativo, além da arquitetura que aparece nas obras, já que utilizamos nosso entorno como referência fotográfica. Já ouvimos um comentário interessante de um curador sobre como retratamos o nosso cotidiano, que esse olhar que se debruça sobre questões do dia-a-dia talvez dialogue diretamente com o ritmo de vida menos frenético de uma cidade pequena como Porto Ferreira – onde nascemos e moramos.

 Como são feitas as escolhas das cenas que vocês pintam?

Nossa produção lida com a nossa própria figura e experiências. Tão logo definimos uma ideia, começamos a gerar imagens de referência para a obra através de performances registradas por fotografia. Revezamos entre quem performa e quem fotografa. Dizemos que esse processo é como rascunhar, é onde entendemos melhor o que vamos representar, qual a potência de cada ângulo, ação e ambiente. “Para Uma Pintura “é um trabalho conceitual que surgiu a partir disso.

 Quais são suas referências?

Nós adoramos tudo que tenha um apelo visual gráfico, gravura japonesa, quadrinhos. David Hockney, Luiz Zerbini, Beatriz Milhazes, Patrick Caulfield são alguns dos artistas que nos inspiram muito.

Porque as escolhas por ambientes fechados?

 Visualmente, nos interessamos muito pelo ambiente doméstico, espaço muito potente pra explorar as emoções humanas. Adoramos lidar com os elementos decorativos e estamparia como forma de inserir micronarrativas e detalhes que quebrem com uma certa noção de realidade.

Tangerina Bruno – Fogo Alto

  Mesmo as pinturas retratarem interiores há muita luz que a pintura irradia isso é intencional?

 O uso das cores, dessa luz, vem muito pra transmitir a sensação que a cena retratada nos desperta. Gostamos do contraste entre uma cena que no seu desenho parece ambientada num ambiente real mas que através das cores, detalhes e texturas diga respeito à outras percepções.

 Quais são os próximos planos de vocês?

 Acabamos de finalizar esculturas para uma instalação inédita que vamos apresentar agora em dezembro na Galeria Kogan Amaro, em São Paulo – será algo muito afetivo pra gente. Estamos bastante animados com o que está por vir.

Tangerina Bruno – As ocasiões de um recém-nascimento
Tangerina Bruno – Corpo encharcado de óleo
Tangerina Bruno – Os ventos dos reveses e recompensas
Letícia e Cirillo – Tangerina Bruno – Foto Suellen Nascimento