Sabe aquele ditado “Nunca te vi e sempre te amei”, assim é o trabalho da artista Maria Amélia Raeder. Eu conheço o trabalho, mas não conheço a artista. As possibilidades e o capo de ação do trabalho me emociona. Como jornalista, eu adoro um jornal e as inúmeras possibilidades de diagramação e janelas que as fotos abrem para as notícias.
Nesse caminho de possibilidades Maria Amélia Raeder constrói sua linguagem. Conversamos com a artista e a entrevista ficou muito interessante.
Quando você começou a fazer arte?
Desde nova, sempre me interessei por arte. Não tenho na família artistas, mas meus avós, que me criaram, tinham a artesania como hobby. Ele tinha uma oficina de marcenaria e ela de pintura de objetos. Esse gosto pela apropriação e transformação acho que veio desta convivência. Eu ficava completamente fascinada pelo que via. Então, muito nova já desenhava e produzia objetos me apropriando do que havia por perto. Continuei com essa prática ao longo dos anos, mas só em 2015, com uma pesquisa mais consistente, me percebi como artista, fazendo arte.
Qual é a sua formação?
Minha primeira formação foi em TI-Tecnologia da Informação na PUC, na época um universo em ebulição que atiçou toda minha curiosidade. Mas em poucos anos percebi que a minha paixão não estava ali. Então, fiz outra graduação em arquitetura e depois uma especialização quando morei em Houston.
Lá trabalhei como arquiteta por 3 anos, e usava todo tempo livre nos museus e nos cursos de
arte da Glassell School of Art. Quando voltei ao Brasil, continuei trabalhando com arquitetura, mas cada vez mais envolvida com a arte nos inúmeros cursos práticos e teóricos que fiz no Parque Lage, no Paço Imperial, entre outros. No início deste ano completei uma Pós graduação em Arte e Filosofia na PUC.
A sua pesquisa envolve a mídia impressa, como você desenvolve essa pesquisa?
Minha pesquisa está muito relacionada com as questões da construção da memória e tudo que a envolve. O Jornal, como veículo de circulação de informação e consequentemente registro da história e da memória coletiva, é uma fonte inesgotável de trabalho. Ao abrir lacunas e suspender parcialmente suas narrativas, o que me interessa é proporcionar outras possibilidades de relação tanto com a imagem jornalística, quanto com a natureza da notícia e da sua transmissão. Se eu conseguir suspender o impulso de consumo imediato, mesmo que minimamente, já fico muito feliz.
Seu interesse pelo fotojornalismo permeia seus trabalhos mais pelas imagens ou pelo formato em que ela é publicada?
No jornal, tanto me interesso pela sua estrutura quanto por seu conteúdo. De modo geral, essas duas facetas estão completamente imbricadas. Ora o trabalho tensiona uma questão, ora outra, ora ambas.
Como é a questão da durabilidade da sua obra?
O papel impresso tem um uso muito descartável, como você pensa isso?
Os trabalhos com o Jornal recebem uma camada de fungicida com proteção UV.
Contudo, isso não altera muito sua natureza, só os protege um pouco mais. Essas obras exigem mais cuidado na sua exposição. Com o passar dos anos naturalmente vão amarelar e esmaecer, e essa é a beleza de trabalhar com o próprio jornal. Ele funciona como catalizador das questões que o trabalho evoca; o tempo atua como um coautor. A cada ano ele tensiona um pouco mais memória e esquecimento. O trabalho se mantém vivo.
Quando criança temos muitas aulas de aprendizado com cola, tesoura e jornais.
De alguma maneira essa lembrança se perpetua no seu trabalho?
Conscientemente, não. Acredito que as experiências com arquitetura estejam
mais impregnadas em mim.
Quais são seus planos para 2021?
Neste ano, devido a quarentena, frequentei menos o ateliê do que gostaria. Para compensar essa ausência, acabei dedicando mais tempo aos estudos e a projetos que não exigiam minha presença lá. Esta imersão trouxe novos desafios pra minha prática e resultou em inúmeros desdobramentos das pesquisas atuais, muitos envolvendo outras mídias além do jornal. Em 2021 pretendo realizar estes projetos, continuar minha pesquisa atual e os estudos acadêmicos. Além disso, tenho planos de participar de uma residência artística, mas isso, com certeza, depende do rumo que o mundo irá tomar. Que seja mais leve e promissor.