A Galeria Mercedes Viegas inaugura, no sábado, 10 de setembro, a exposição “A carne das folhas” da artista visual Goia Mujalli. A artista, que cresceu no Rio de Janeiro e atualmente mora em Londres, apresenta uma série de sete pinturas inéditas, em que amplia seu vocabulário de linhas, formas e padronagens a partir da flora tropical.
Em um caminho inverso dos botânicos que acompanhavam as expedições para o Novo Mundo, a artista encontra e (re)conhece folhas e flores do Brasil, em diversos lugares da Europa. E documenta essas histórias em abstrações rítmicas, de ricas cores.
Uma delas é sobre a bougainville, que Goia Mujalli encontrou durante uma residência artística na Itália, foi considerada a grande descoberta de uma viagem francesa ao Rio de Janeiro no século 18. Em solo carioca a “trepadeira maravilhosa”, como os franceses chamaram a planta, foi encontrada pela naturalista Jeanne Baret (1740-1807), que adotou o nome Jean Baret e características masculinas com o intuito de integrar a expedição, já que, nessa época, o ambiente era unicamente formado por homens.
Essas histórias de mulheres lutando pelo seu espaço perpassam a narrativa da artista. “Minha avó costurava e dava aulas escondido do meu avô, que não queria que ela trabalhasse. Mesmo assim ela o fez, como forma de resistência. E essa história se revelou depois que ela faleceu”, conta.
Várias plantas que Goia Mujalli se inspira, foram encontradas no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, que pode ser visto pela janela da galeria. Outros tipos de vegetação, sempre tropicais, apareceram para ela na Europa, por meio de observação, mas principalmente intuição. “Me sinto atraída por essas plantas porque devo reconhecê-las da infância, de reconhecer a natureza do meu próprio país”.
Além do seu alfabeto criado por meio da flora, seu vocabulário visual vai adicionando elementos a cada série. Nas obras em exibição na Mercedes Viegas, a pincelada dialoga com tecidos e bordados, em uma narrativa que vai se construindo ao longo do processo. “Quanto mais complicada a pintura, mais interessante ela fica para mim. Criar histórias, camadas e texturas. Mesmo planejando, não se sabe o que vai acontecer. É também uma analogia à vida”, completa.
Sobre a materialidade das plantas, o título da mostra faz referência a uma passagem do livro “Uma aprendizagem: ou O Livro dos prazeres”, de Clarice Lispector:
“- Sabe o que é sarcofila?
– Nunca ouvi esta palavra, respondeu.
– Sarcofila é a parte carnosa das folhas. Segure esta e sinta.
Estendeu-lhe a folha, Lóri tateou-a com dedos sensíveis e esmagou-lhe a sarcófila. Era lindo dizer e pegar em: sarcofila”.