A artista plástica pintora Letícia Lopes é um total mistério. Um livro de contos de fadas e bruxas ilustrado. Não, claro ela é de carne e osso. Mas, sua pintura reflete um mundo que talvez só ela tenha a consciência. Ela dá luz a cores e sombras incutidas nas camada de tintas e nas camadas da memória. São cenas que vislumbramos e que despertam aquela sensibilidade da cor e da forma. Sem discursos por favor. Sensações e disso que Letícia trata em primeiro plano. A artista está no seleto grupo de novos artistas que habitam o circuito da arte contemporânea de São Paulo. A galeria Verve dos art dealers Allan Seabra e Ian Duarte Lucas são seus representantes e pedimos algumas palavras para ele comentarem sobre o trabalho de Letícia Lopes.
“O trabalho da Letícia Lopes é sem dúvida um dos melhores expoentes desta vibrante nova geração da pintura brasileira. Suas referências históricas, inclusive sobre a própria história da pintura, são revisitadas com grande frescor, em telas absolutamente hipnotizantes, atmosféricas e sensuais” conta Ian Lucas.
1) Quando você começou a dedicar mais tempo a pintura?
– Bom, foi quando eu mudei de curso – saí do Design da ESPM e entrei no Bacharel em Artes Visuais – que comecei a pintar mais. Já pintava antes, mas era uma coisa que outra. Aí, a partir de 2011, como estudante de artes, meu trabalho foi gradativamente se inclinando para a pintura, até que em 2014 eu recebi um prêmio do Instituto Estadual de Artes Visuais do RS com minha primeira exposição individual, que já apontava meu interesse na pintura. Desde lá, entendi que era com ela que queria mexer, e isso vem num crescendo constante até hoje.
2) Foi importante na sua infância a educação artística?
– Não considero que pude usufruir de uma “educação artística”, pois nasci em uma cidade do interior que não valoriza nem incentiva esse direcionamento. Porém meus pais notaram que desde cedo eu me interessava por tudo que envolvesse o conhecimento sensível, fosse desenho, pintura, literatura, fotografia, cinema. Então eu lembro de eles sempre me expondo a folhas em branco e lápis de cor ou tinta, fiz aula de teatro e dança, e sempre tive acesso a muitos livros. No colégio, lembro de gostar bastante das aulas de “Artes”, porém nunca ninguém levou nada a sério nesse âmbito. Não tive uma aproximação mais concreta ao que posso considerar de educação artística até entrar na faculdade de Design, em 2008.
3) O que lhe causa a emoção da beleza?
– Um estado de assombro, seguido de euforia.
4) A cor na sua pintura transmite uma emoção como você alcança essa ponto sensível?
– Eu me aproximo da pintura com uma intenção de procura, uma curiosidade meio predatória. Sinto que aguço sentidos instintivos enquanto trabalho, e tento me manter num esforço de escuta, como quem caça. Nesse processo, a cor entra como…uma isca primeiro, talvez, e depois, uma pista. Uma pista pra chegar mais perto do alvo. Cada vez que acerto a cor, sinto que raspo a unha no calcanhar do que persigo.
5) Quem são os seus ícones que você estuda?
– Muitas e muitos, e não necessariamente só gente que trabalha com pintura. O time varia bastante, mas tem um petit comitê que está sempre me olhando por sobre os ombros: Manet, Marlene Dumas, Mamma Anderson, Luc Tuymans, Neo Rauch, Rauschenberg, Tunga, Peter Doig, Sofia Borges, Gerhard Richter, David Salle, Philip Guston, El Greco. Ultimamente tenho olhado muito pra Eva Hesse, Sterling Ruby, Eric Fishl, Mirian Cahn, Karen Kilimnick. O Antonioni está sempre me assombrando com Blow Up, que deixo tocando no atelier enquanto trabalho, e a poesia completa de Herberto Helder é meu livro de cabeceira atualmente.
6) Qual a questão que você trabalha mais forte na sua pintura?
– O mistério, o desconhecido, e a eroticidade.
7) Você acha sua pintura feminina?
– A pintura é uma linguagem sem gênero na minha opinião.
8) O mundo POP te fascina?
– Profundamente. E é engraçado porque ele exerce sobre mim um encanto, um feitiço ilusório, que assim como enche meus olhos de repente, em seguida se desmancha num sopro. Mas eu adoro me sentir levemente enganada, gosto do truque, então sempre caio.
9) Na pandemia o que você anda fazendo?
– De tudo um pouco. Como eu sempre adorei ficar sozinha, este período está sendo muito bom pra mim. Porém, sinto que todos os dias preciso fingir pra mim mesma que a atmosfera está “tolerável”, quando na verdade sei perfeitamente que estou sobrevivendo a algo que mata milhares diariamente, o que é insano, mexe com o espírito. Tenho lido e escrito como nunca.
10) A pintura para você foi uma escolha difícil?
– Não lembro de escolher, ela veio invadindo. A pintura é uma senhora inteligente, antiga e muito misteriosa, só posso dizer que é uma honra e um desafio mantê-la em minha vida.