A exposição “Um oceano para lavar as mãos” vai inaugurar o Centro Cultural Sesc Quitandinha, em Petrópolis, Rio de Janeiro, em 15 abril de 2023.
Os curadores Marcelo Campos e Filipe Graciano reuniram aproximadamente 40 obras dos artistas Aline Motta, Arjan Martins, Ayrson Heráclito, Azizi Cipriano, Cipriano, Juliana dos Santos, Lidia Lisbôa, Moisés Patrício, Nádia Taquary, Rosana Paulino, Thiago Costa e Tiago Sant’ana, que ocuparão um espaço monumental de 3.350 metros quadrados.
“Um oceano para lavar as mãos”, título retirado de um verso da música “Meia-noite” (1985), de Chico Buarque e Edu Lobo, se propõe a uma revisão da história do Brasil, pensada por curadores e artistas negros. A mostra busca ainda refletir sobre a cidade de Petrópolis, conhecida como “imperial”, e que tem uma forte memória negra.
A exposição será acompanhada, ao longo de seis meses, de uma programação gratuita semanal de música, cinema, teatro, literatura, atividades infantis, oficinas e um seminário. O Café Concerto do Centro Cultural Sesc Quitandinha, amplo teatro com capacidade para 270 pessoas, vai sediar os shows de música e a mostra de cinema. Os curadores são todos negros. Tiganá Santana, cantor, compositor, violonista e poeta baiano, coordenará a área de música.
A mostra de cinema terá como curador Clementino Junior, cineasta dedicado à difusão da obra audiovisual racializada. O grupo Pretinhas Leitoras, formado pelas gêmeas Helena e Eduarda Ferreira, nascidas em 2008 no Morro da Providência, no Rio de Janeiro, estará à frente das atividades infantis, que serão feitas na Biblioteca do Centro Cultural. Para ampliar a percepção do público das obras expostas, haverá oito oficinas e laboratórios, nos salões da exposição e nas Varandas. Flávio Gomes, pesquisador do pensamento social e da história do racismo, da escravidão e da história atlântica, será o curador das ações da linguagem escrita, literária e oral paralelas à exposição. Estão também sendo programadas performances com grupos artísticos.
No dia 15 de abril, às 19h, haverá um show de Juçara Marçal.
Marcelo Campos conta que em aulas, bibliografias e várias ações, há “importantes revisões históricas no Brasil, com a inclusão de autoras e autores negros”. Enquanto nos anos 1990 os afro-americanos já “iam direto na ferida”, observa, no Brasil as iniciativas eram isoladas. As políticas públicas dos últimos 20 anos, entretanto, com as cotas para estudantes negros, “em que a UERJ foi pioneira”, e a penetração das universidades no interior do país, como Cariri e Recôncavo Baiano, propiciaram a que os negros passassem a ter acesso às diversas áreas de conhecimento. “Esta pressão obrigou a academia e os espaços de arte a se modificarem”.
Ele diz que passou a observar “o modo como os artistas negros lidam com o período das navegações”. “Este trauma, esta tragédia de nossa sociedade, exibidos nas documentações de maneira normalizada, com ilustrações de grilhões, correntes. Junto com os artistas, pensamos em como lidar com isso”, diz. “De que modo a arte lida com o imaginário do trauma da escravidão, da diáspora”.
Ele menciona as pesquisas feitas pelo sociólogo inglês Paul Gilroy, estudioso da diáspora negra, e autor do livro “Atlântico negro” (1993), tema presente nos trabalhos, e lembra que a artista Rosana Paulino, em conjunto de trabalhos de 2016, chamou de “Atlântico vermelho”, em alusão a Gilroy, evocando a violência da escravidão e seus desdobramentos até os dias de hoje.
Dos doze artistas convidados, seis foram comissionados para criarem trabalhos especialmente para a exposição: Azizi Cypriano, Juliana dos Santos, Moisés Patrício, Pedro Cipriano, Thiago Costa e Tiago Sant’ana.
Filipe Graciano, arquiteto e urbanista, idealizador do Museu de Memória Negra, de Petrópolis, e coordenador de Promoção da Igualdade Racial do Município, conta que a expografia vai salientar a ideia de encontros contida nos múltiplos significados que a palavra oceano traz. “A monumentalidade do espaço do Centro Cultural Sesc Quitandinha vai ao encontro da monumentalidade da existência negra no Brasil”, observa.
Graciano assinala a importância do olhar curatorial negro, com artistas negros, para contar “outra história, que não a única no Brasil”. “A potencialidade das mãos, de lavar a história”. “A exposição é quase um ato de reparação histórica”, afirma, observando que o trabalho educativo dará uma contribuição para “repensar a memória da cidade”.
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