A abertura da exposição de José Patrício na Galeria Nara Roesler ontem (18/05) em Ipanema

O celebrado artista pernambucano José Patrício , que usa materiais simples destinados ao descarte, para criar padrões geométricos e cinéticos, mostrará trabalhos inéditos, em diversas séries com botões costurados em tela sobre suporte de madeira, e um conjunto de “Conexões cromáticas”, em que usa selos postais sobre impressão em papel.

 

Alexandre Rosler e José Patrício
Alexandre Rosler e José Patrício

 

Nara Roesler Rio de Janeiro teve o prazer de inaugurar ontem 18/05 a exposição José Patrício”, com obras inéditas do celebrado artista pernambucano, com botões costurados em telas, sobre suporte de madeira, e um conjunto de obras com selos postais sobre impressão em papel.

Laura Salles
Laura Salles

 

Os trabalhos com botões, que se tornaram emblemáticos na trajetória de José Patrício, começaram em 2005, derivados das obras feitas com dominós, que chamou a atenção do circuito da arte para o artista, quando criou uma instalação para o convento de São Francisco, em João Pessoa, usando as peças do jogo.

Adriana Lernner, Jackie Light e Douglas Conceição
Adriana Lernner, Jackie Light e Douglas Conceição

 

“Nesta exposição na Nara Roesler, no Rio, houve uma tentativa de dar uma unidade a partir dos elementos e do tratamento que foi dado a eles, no caso o botão. Por outro lado, este aspecto cinético que existe nas obras também traz esta unidade”, conta o artista.

“Progressão cinética XI” (2022), com 161 x 159 cm, “comenta um pouco o trabalho que considero importante, que é uma série de instalações com dominós montados no chão, chamada ‘Arte combinatória’, que se compõe por quadrados realizados por três jogos de dominó, e, em cada ação, o resultado é diferente”, diz José Patrício. “Esta obra é também uma arte combinatória que utiliza os botões”.

Beatrice Ponce Leon Gouvea, Mariana Orberg, Laura Grant e Roberta Letta
Beatrice Ponce Leon Gouvea, Mariana Orberg, Laura Grant e Roberta Letta

 

As obras com botões têm 3.600 quadrados cada, e apenas um espaço central permanece vazio. O artista usa uma grade com 80 espaços em um lado e 80 no outro, “totalizando 3.600 quadradinhos que são preenchidos com os botões”. “A forma de preencher são muitas, infinitas, não só a partir dos elementos à disposição, mas também das seqüência que serão criadas ali na estrutura”.

Laura Grant e Roberta Letta
Laura Grant e Roberta Letta

 

As exceções são Espirais cinéticas II (2022) e Espirais cinéticas III (2022), dois dípticos medindo respectivamente 115,5 x 222 cm e 114 x 224 cm, que têm um viés cinético e utilizam a estrutura de 112 dominós, recorrente no trabalho do artista.  

 

REPETIÇÃO

“Como a frase de Nelson Rodrigues, a chave-mestra do meu trabalho talvez seja essa da repetição, que a cada concretização de uma obra consegue ser diferente. Eu repito sempre, mas também sempre tenho resultados diferentes. É algo que me move. Fazer este exercício de conseguir resultados novos a partir de uma estrutura dada”, explica.

Mariana Orberg
Mariana Orberg

 

ESPIRAIS

Outro aspecto recorrente no trabalho de José Patrício são as espirais. Diante das quase infinitas possibilidades de combinação dos botões, ele trabalha com dois movimentos contrários, que geram duas espirais inversas. Ele utiliza dois quadrados, e quando trabalha com uma afinidade cromática, parte do centro de um quadrado com um botão, e coloca outro igual na ponta do outro quadrado, e assim sucessivamente. “Então a gente vai montando tudo num movimento de espiral, e no final temos dois movimentos contrários, onde todos os botões estão posicionados um atrás do outro, numa espiral e na outra também”. Ele destaca que “a espiral é que me ajuda a estruturar a obra. Há sempre essa espiral, e a montagem do trabalho se dá gradativamente, seja do centro para a borda, seja da borda para o centro. É sempre um movimento de espiral para o qual é preciso prestar bastante atenção no momento em que a obra está sendo montada, para que não se perca essa linha da espiral, porque isso permite que se chegue ao final do quadrado com a espiral funcionando perfeitamente, circundando a estrutura que vai sendo criada”.

“Tento me ater a esta estrutura e aos movimentos possíveis dentro dela, que é o movimento crescente num dos quadrados, e o movimento decrescente no outro quadrado. Os botões são peças heterogêneas, não são como os dominós, que são pecinhas que têm o tamanho certo e uma numeração, e são apenas 28”, explica.

No livro “José Patrício – Percursos de criação” (2021), bilíngüe (port/ing), 196 páginas, o artista relata que “a memória mais remota que tenho da minha afeição por botões é de quando os encontrava no armarinho da minha avó, no Recife, misturados e acondicionados em potes de vidro, caixas de papelão ou bacias de alumínio, fruto das sobras que iam se acumulando ao longo do tempo”.

Mas outro aspecto importante na escolha deste material “é a obsolescência do botão”, pelo uso cada vez menor de costureiras diante de roupas prontas e a preços acessíveis. “Quando encontro um conjunto de botões em lojas de armarinhos, liquidações, e tudo estava um pouco abandonado e sendo descartado, sendo vendido por um preço muito barato, eu resgato tudo isso e organizo, de alguma maneira, numa estrutura que é harmônica. É um pouco dar ordem ao caos”, diz.

Astrid Reagler, Olavo Pereira, Fernando Barroso do Amaral e Rosa Moreira
Astrid Reagler, Olavo Pereira, Fernando Barroso do Amaral e Rosa Moreira

 

José Patrício na Galeria Nara Roesler

 

MATEMÁTICA X IMPONDERÁVEL

José Patrício não utiliza projetos ou desenhos para criar seus trabalhos, apenas “alguns cálculos matemáticos, mas não para todas as obras”. “Cada obra tem suas exigências. Tenho trabalhado com procedimentos muito precisos. Eu lido muito com o imprevisto, com o aleatório. Na maioria das vezes eu não sei qual será o resultado final. Isso não me preocupa muito também”, afirma.

“As obras que têm botões heterogêneos são montadas por pessoas que me ajudam, e muitas vezes elas decidem o que vem antes e o que vem depois. O meu trabalho comporta tudo, aceita tudo, e sempre vai dar certo. Não tem como dar errado, porque depois que está ali montado, já está certo. É um pouco como os processos naturais, onde as coisas têm já uma lógica como na natureza, onde tudo tem uma ordem oculta”, observa. “Meu trabalho é muito racional, mas lida com esse outro aspecto que é o acaso, a questão do imponderável, do improvável.

É sempre esse jogo entre ordem e acaso. O trabalho pode abrigar as decisões de outras pessoas, porque este acaso permite que os elementos se posicionem e que o resultado seja sempre satisfatório na medida em que vai resultar, inevitavelmente, em uma harmonia. Só o fato de organizar esses elementos em uma grade, numa malha, esta ordem já traz algo de harmonia. Harmonia que pode se dar inevitalmente por essa organização, independente de escolha”.

Armando Strzenberg e Rosa Moreira
Armando Strzenberg e Rosa Moreira

 

SELOS POSTAIS

Interessado por selos postais desde a infância, quando começou uma coleção, José Patrício criou as obras da série “Conexões cromáticas” (2016), com uma gama variada de tonalidades, que foram selecionadas e classificadas de acordo com o seu teor cromático. Cada obra dessa série utiliza selos de uma mesma tipologia impressos em cores e tonalidades distintas, ordenados e colados em uma grade regular, impressa sobre o suporte.

“Nos selos da Inglaterra, por exemplo, corriqueiramente há uma variedade enorme cromática, e de valores”, diz.

Camila Bechelany e José Patrício
Camila Bechelany e José Patrício

 

 

FORMAÇÃO PELO OLHAR

Em 1975, José Patrício ingressou na escolinha de arte de Augusto Rodrigues, em Recife, a única “possibilidade de formação artística, com toda uma estrutura que ajudava os alunos, que podiam escolher uma determinada técnica”.

 

https://nararoesler.art/

 

YouTube – https://www.youtube.com/user/galerianararoesler