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Com curadoria de João Farkas, a mostra Assim é se lhe parece abre em 29 de novembro reunindo obras que reforçam a visão única do profissional, leal até hoje ao analógico: “É fascinante saber que o fotógrafo tem a possibilidade de captar uma imagem do real num metal nobre como a prata”, diz ele

Exposição ASSIM É SE LHE PARECE de ANTONIO AUGUSTO FONTES na GALERIA DA GÁVEA
Exposição ASSIM É SE LHE PARECE de ANTONIO AUGUSTO FONTES na GALERIA DA GÁVEA

Um dos mais atuantes fotógrafos brasileiros com carreira consolidada a partir dos anos 1980, autor da série icônica Raso da Catarina, produzida no sertão da Bahia, Antonio Augusto Fontes ganha a partir de 29 de novembro uma exposição de seus trabalhos na Galeria da Gávea, no Rio de Janeiro. Com curadoria de João Farkas, a mostra Assim é se lhe parece terá cerca de 60 imagens, que abrangem diversos aspectos de uma produção igualmente rica nos variados temas que retratou e no apuro técnico do fotógrafo, um entusiasta do preto e branco que se manteve fiel à fotografia analógica.  

“O que estamos fazendo nesta exposição é nos voltar para o Antonio Augusto com um olhar retrospectivo e definitivo no seguinte aspecto: o que ele tem nos apresentado, o que é o seu olhar sobre o mundo?” diz Farkas. “Não estou falando do que já foi visto e publicado, não é isto. É aquilo que chama atenção hoje pela sua característica de um olhar pessoal sobre o mundo, aquilo que nos tira da visão já construída sobre a fotografia. Vamos mostrar a visão do Antonio Augusto para a linguagem fotográfica.”

Além de exemplares da série Raso da Catarina e de seu desdobramento, Sertão ao Quadrado, a exposição reúne trabalhos feitos em três países: Estados Unidos, onde residiu por alguns anos na década de 1970 para estudar fotografia, antropologia e história da arte, registrando a contracultura e os protestos contra a Guerra do Vietnã; França, para onde viajou depois de ganhar o prêmio Eugène Atget, com a missão, junto a fotógrafos de outros países, de retratar Paris através do olhar estrangeiro (“um verdadeiro desafio na que é provavelmente a cidade mais bem fotografada do mundo”, diz ele); e China. 

Atef Talbi e seu filho Jude e Pierre Biden e seu filho Tadeu
Atef Talbi e seu filho Jude e Pierre Biden e seu filho Tadeu

 

Há ainda belas imagens do Rio de Janeiro que fogem ao clichê (como um registro do Morro Dois Irmãos muito diferente daquele que se vê habitualmente das praias de Ipanema e Leblon); retratos de personalidades da cultura brasileira, como o poeta João Cabral de Melo Neto, o cineasta Glauber Rocha, a escritora Nélida Pinon, o fotógrafo Walter Firmo, e o compositor e escritor Chico Buarque; e também belas fotografias de corpos – de pessoas na praia, especialmente Praia Formosa, no seu estado natal, e corpos nus.  

O olhar que se desloca para várias direções, que busca o que há de especial em cada assunto, tem razão de ser. Para Antonio Augusto Fontes, o estilo pode ser uma prisão. “Millôr Fernandes tem uma frase sobre ele mesmo de que gosto muito: ‘Enfim, um escritor sem estilo’. Porque o estilo pode limitar o alcance visual de um fotógrafo. Muitas vezes o fotógrafo fica preso a seu próprio olhar, algo meio narcísico”, diz.

O que o visitante vai ver na exposição é o amplo e generoso espectro de interesses de Antonio Augusto Fontes, que abandonou o curso de Engenharia Mecânica na Universidade Federal da Paraíba depois de se encantar por um ensaio do francês Henri Cartier-Bresson publicado na revista Manchete. “Cartier-Bresson é o culpado por eu ter descoberto minha vocação”, brinca.

João Farkas , Bazinha e Catarina Fontes e Glaucia Leme
João Farkas , Bazinha e Catarina Fontes e Glaucia Leme

 

O jovem dividido entre as aulas com cálculos que o interessavam (“eu gostava da engenharia”, conta), mas às quais ia cada vez menos, e as ruas com suas imagens encantadoras – pelas quais perambulava cada vez mais –, acabou respondendo a um ultimato dado pelo pai: era preciso definir o que faria da vida.

Fez a opção pelo ofício de Bresson (“o mais zen dos fotógrafos, é marcante a sua ligação com o tempo, a forma”, diz); do americano Walker Evans (“tem um olhar austero, direto, uma espécie de João Cabral da fotografia”); do francês Eugène Atget (“me revelou a importância do silêncio na imagem”) e ainda do tcheco Josef Koudelka e do suíço-americano Robert Frank (“ambos fotografam com as vísceras, uma força interior muito grande”). 

É uma lista de peso, que ajudou a moldar a visão de mundo e a fotográfica de Antonio Augusto Fontes, a quem tanto Farkas como outro colega das lentes, Cássio Vasconcellos, chamam de filósofo da fotografia – pela cultura e pelo conhecimento acumulados, é certo, mas também pela habilidade de articular pensamentos, pelas opiniões fortes e profundas, que o tornaram um mestre de muitos outros profissionais – durante muito tempo deu aulas em sua casa em Santa Teresa, de onde os alunos, muitos tornados amigos, resistiam em ir embora.

O depoimento de Cássio sobre Antonio Augusto é um dos coletados num curto vídeo sobre o fotógrafo que será exibido na exposição, e que tem falas também do próprio Fontes, de Luiz Braga e de Farkas.

Ione Costa e Ana Stewart - GALERIA DA GÁVEA
Ione Costa e Ana Stewart – GALERIA DA GÁVEA

 

Nele, o curador de Assim é se lhe parece observa: “A fotografia é muito eclética, ela transita muito bem entre documentação e expressão. É difícil dizer se foi a prática da fotografia que engendrou o pensamento do Antonio Augusto Fontes sobre fotografia ou se é o pensamento dele sobre fotografia que ilumina as imagens que ele produz. Muito provavelmente é uma relação dialética, que uma coisa vai formando a outra.”

O visitante também verá, na Galeria da Gávea, a reprodução de um pequeno laboratório fotográfico, reforçando a opção de Antonio Augusto Fontes pelo analógico em detrimento do digital, plataforma para a qual a quase totalidade dos profissionais da área migrou e que ele rejeita ardentemente, tendo feito do laboratório de sua casa um local “de trabalho, meditação e devoção”. “Sou apaixonado pelo laboratório fotográfico”, explica. “É parte essencial do meu trabalho. É fascinante saber que o fotógrafo tem a possibilidade de captar uma imagem do real num metal nobre como a prata.” 

Daniella Cavalcanti , Antonia Bernardes e Ursula Tautz
Daniella Cavalcanti , Antonia Bernardes e Ursula Tautz

 

Sobre Antonio Augusto Fontes

Antonio Augusto Sales Fontes nasceu em João Pessoa, Paraíba, em 1948. Estudou engenharia na Universidade Federal da Paraíba, mas não chegou a se formar. De 1970 a 1973, morou nos Estados Unidos, onde estudou fotografia no New York Institute of Photography e antropologia e história da arte no Manchester College. De volta ao Brasil em 1974, fixou-se no Rio de Janeiro, iniciando carreira como fotógrafo profissional.

Nos anos 1980 trabalhou para diversas revistas informativas, entre elas Veja, Exame e IstoÉ, antes de se decidir pela atuação independente no campo da fotografia documental, nos anos 1990. Entre 1975 e 1980 atuou como consultor técnico do Arquivo Fotográfico do Centro de Pesquisa e Documentação da Fundação Getúlio Vargas e do Arquivo Nacional. Dedicou-se também à fotografia de expressão pessoal.

Recebeu diversos prêmios, entre eles o Eugène Atget, promovido pela Air France, pela Prefeitura de Paris e Paris Audiovisuel (1984), e o prêmio Marc Ferrez de Fotografia (1991), para desenvolvimento do ensaio fotográfico Rio de Janeiro: um olhar cego sobre a cidade. Suas obras integram importantes acervos, como a Coleção Pirelli/Masp de Fotografias (São Paulo, SP) e a Coleção Joaquim Paiva (MAM-Rio).  

Patricia Barbosa e Silvano Martins
Patricia Barbosa e Silvano Martins

 

Assim é se lhe parece

Fotografias de Antonio Augusto Fontes

Curadoria de João Farkas

Galeria da Gávea (Rua Marquês de São Vicente, 432 – Gávea, Rio de Janeiro)

Abertura dia 28 de novembro, às 18h, para convidados 

Período: de 29 de novembro de 2024 a 28 de fevereiro de 2025

Horário de funcionamento: segunda a sexta, das 11h às 19h

(não abrirá nos dias 24/12, 25/12, 31/12/2024 e 01/01/2025)

Instagram: @galeriadagavea

www.galeriadagavea.com.br

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